As novidades de Janeiro

 

Dia 23 nas livrarias.

 

O Inquilino Quimérico | Roland Topor

trad. Júlio Henriques

168 pp.

Para lhe quererem mal a este ponto, que crime teria ele cometido? Talvez o mesmo que a mosca apanhada na armadilha da teia de aranha.

Adaptado ao cinema por Roman Polanski em 1976, O Inquilino Quimérico (1964) é, além de um clássico do humor negro com recortes kafkianos, uma obra que aborda temas decerto familiares a alguns leitores: a má vizinhança, os problemas de condomínio e as agruras da propriedade horizontal. Quando Trelkovsky, um novo inquilino num prédio parisiense, se vê subitamente alvo do ódio dos vizinhos, sem motivo aparente, entra numa crise – imobiliária e existencial – com um desfecho imprevisível. A paranóia cresce na medida da hostilidade ao recém-chegado, e resta um dilema: submeter-se à maioria e às suas regras ou seguir o caminho da insanidade?

Roland Topor (1938-1997), pintor, ilustrador, poeta, cançonetista, dramaturgo, encenador, cineasta e fotógrafo, artista francês impossível de catalogar, começou por destacar-se com os desenhos grotescos que publicou na revista satírica Hara-Kiri. Vencedor do Grand Prix de L’Humour Noir em 1961, bebeu dos surrealistas e respondeu-lhes com o movimento Pânico, que fundou com Fernando Arrabal e Alejandro Jodorowsky, entre outros. Em texto como em imagens, Topor atira-nos para um mundo do avesso, e a crueldade animalesca, o erotismo, a escatologia e a tétrica ironia das suas obras valeram-lhe o desprezo de críticos, vários projectos ruinosos e ameaças de morte quotidianas. O prazer foi todo dele.

 

A Promessa | Silvina Ocampo

trad. Helena Pitta | nota preliminar Ernesto Montequin

104 pp.

 

Publicada postumamente em 2011, A Promessa foi o labor dos últimos dias da autora, já atormentada pela doença. Quando, num navio, uma mulher cai ao mar e vê a vida inteira – pessoas, lugares e lembranças – passar-lhe diante dos olhos, promete escrever a sua história se sobreviver. Um romance sobre «a fragilidade da memória e a ilusão da identidade», à deriva num oceano de recordações.

Companheira de Adolfo Bioy Casares, íntima de Alejandra Pizarnik, cúmplice intelectual de Jorge Luis Borges, admirada por autores como Italo Calvino e Roberto Bolaño — nenhuma destas relações serve para compreender inteiramente o mistério de Silvina Ocampo (1903-1993), um dos tesouros mais bem guardados da literatura latino-americana do século XX. Rebelde das letras argentinas, Silvina Ocampo estudou Belas-Artes com Giorgio de Chirico e Fernand Léger, em Paris, mas é no regresso à Buenos Aires natal que encontra a sua voz — nos contos inaugurais de Viaje olvidado (1937), a que se seguiriam A Fúria e Outros Contos (1959) ou As Convidadas (1961), no romance Promessa, publicado postumamente em 2011, e na Antologia da Literatura Fantástica (1940), que organizou com Borges e Casares. Poeta singular, mestre na arte de contar histórias, Silvina Ocampo «vê-nos como se fôssemos feitos de vidro, vê-nos e perdoa-nos» (Borges), narrando o teatro da humanidade com distanciamento e elegância — com notas de insólito, fantasia e terror.


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